quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Um Dia Após Outro Dia


Até o momento em que sai de casa para trabalhar, tudo parecia comum, nada alterava o meu caminho rotineiro. Os cachorros me aguardavam na porta euforicos por alguma coisa que eu pudesse dar a eles. Os pássaros voavam frenénicos em busca de qualquer coisa. A grama alta molhada como sempre. A senhora fazendo exercício na praça em frente. Como eu disse. Nada de novo. Apenas uma coisa me chamou atenção. O perfume da minha esposa quando ela entrou no carro. Muito Bom!


Dei a partida, engatei a marcha ré, gritei com um dos cachorros para ele não sair e então eu sai após o portão escancarar-se. Esperei ele fechar e fui rumo ao conhecido. Direita, direita, lombada, esquerda, lombada, lombada, direita, esquerda, direita, esquerda e enfim o objetivo. Beijinho clássico de despedida e minha mulher desembarca para mais um dia de trabalho. Dou meia volta e retorno para casa. Direita, esquerda, direita, esquerda, lombada, lombada, direita, lombada, esquerda, esquerda, enfim chego. Estaciono o carro em frente do portão e lembro-me que preciso ir até a prefeitura de Joinville resolver o problema do IPTU mais um ano. Pois é, ano passado também acumulei algumas rugas por conta da impressonante incapacidade de gestão pública do nosso governo municipal.


Como que um governo municipal eleito pela maioria do povo de-mo-cra-ti-ca-men-te - como as próprias autoridades gostam de lembrar - trata este povo com tanto desdenho? Como posso eu querer pagar os meus impostos se quem deveria zelar por eles não sabe como arrecadá-lo? Como pode um peixe vivo viver longe de água fria? Quem matou Odete Roitman? Com quantos paus se faz uma canoa? Se o mar fosse rosa borboletas não voariam? Quem souber essas respostas sinta-se supremo. Porque é mais fácil aceitar a vida como ela é, a ter que decifrar tais enigmas. Sim! São enigmas travestidos de perguntas aparentemente simples.


Meu dia presseguiu. Enfim a hora do almoço. Dois frangos empanados com recheio de presunto e queijo, um pouco de arroz, verdura picada (não me entendam mau), um copo de guaraná e muita fome. "O ministério da gula adverte, parar de fumar causa barriga". Estou parecendo um saco sem fundo. Tenho comido até dormindo. Assisto o Globo Esporte e vejo cenas da novela Ronaldinho Gaúcho. Lembro-me da palavra dinheiro, mas logo passa, pois sei que ele quer apenas jogar bola. Mudo de canal e a Record se esbalda com seu conceito de que o fim do mundo está próximo. Assassinatos, violência, prisões e casos medonhos narrados em voz firme pelos apresentadores "formadores de opinião".


O dia está em seu fim. Então passo para buscar minha mulher e retorno para casa. Um banho, depois um café acompanhado de alguns pães com queijo e requeijão. Já sei que tenho comido demais. Ligo novamente a TV e assisto aterrorizado ao caos que se formou na serra carioca. Culpa de quem? Se souber a resposta dessa também, me avise. Contudo, reparo na total falta de estrutura para se atender os feridos num caso como este. Pessoas são atendidas deitadas em lençóis na grama no mínimo úmida. Helicópteros de emissoras são utilizados para salvamento e com um otimismo cego, chamam isso de solidariedade. Eu chamo de precariedade pública.


O Estado está falido fisicamente e moralmente. Não existe se quer um plano de salvamento emergêncial para catastrofes. O porque disso eu sei a resposta. Porque somos um país de incompetência gestora absurda. Porque nossos ex-presidentes a agora nossa atual presidente, transforma um monte de lama em máscara para tirar rugas. Manipula a população tapando o sol com a peneira, mais uma vez. Dando entrevista para divulgar o seu plano emergêncial. "Os moradores atingidos pelas chuvas poderão utilizar o seu FGTS para reconstruir o que perderam". Como diria meus amigos de São Paulo. "Tá me tirando tia!". Prometem liberar milhões para ajudar os moradores desolados. Prometem ajuda, prometem, prometem, apenas prometem.


O fim do dia afinal chegou. Vou me deitar e ler um pouco. Assisto o CSI, o Big Brother levanto para ir ao banheiro escovar os dentes e tirar a água do joelho. Volto para cama, mato alguns pernelongos chatos com a minha raquete assassina e ajeito o travesseiro. Dou um cheiro na galega que já está dormindo e relaxo para acompanhá-la. De repente me vem a cabeça uma frase que vi na traseira de um caminhão um dia desses e achei muito interesssante: "Otimistas são pessimistas mal informados". A partir deste momento não me lembro mais o que aconteceu, naquele lindo dia de janeiro de 2011. Apenas me recordo de acordar ouvindo meus cachoros latindo, pois como já dizia Martin Luther King, "Uma criança, cega de nascença, só sabe de sua cegueira se alguém lhe conta".